Nasci entre os imortais
Com o passar das eras vi tudo que era belo nascer e crescer
Na aurora dos tempos
Na longínqua Primavera do mundo sob os ciprestes
Onde a luz dourada nos iluminava
Onde havia um sentimento que não existe mais
Nos dias da bem-aventurança
Onde os imortais gozavam de uma felicidade que parecia eterna
Onde a o mundo aindaa era jovem, sem mácula
Dentro de cada alma, havia algo que brilhava
Algo que fazia aqueles tempos passados
Serem tempos dourados
Nos bosques bucólicos
Nós festejamos com canções sobre a beleza da existência
Daquele mundo que ainda era virgem e inocente
As flores de sonhos dourados refletiam a plenitude
Do alvorecer longínquo que não pode mais voltar
Até que elas caíram e deram lugar a verdes folhas
Eras se passaram até o Verão
Os dias se tornaram mais rápidos
Os grandes artífices criaram maravilhas esplêndidas
Que já se perderam sob as areias do tempo
Os grandes povos construiram suas cidades
Prateadas com suas cúpulas de ouro
Mas eu vi também a chegada dos mortais
E com eles a guerra e a doença
Apesar disso, ensinamos para eles todas as nossas artes
Nos tornamos inspirações de suas lendas
E mesmo naquela época, os mortais gozavam de longa vida
E felizes eram os seus dias
Eu vi as guerras dos cálices e dos anéis
Vi os primeiros de meu povo imortal tombar
Sob o poder sombrio que começava a crescer
Mas nós e os mortais o vencemos, pois o mundo era jovem
E grandes heróis surgiram, e regozijaram-se com a vitória
Naqueles tempos passados
Eu era a princesa naquele mundo fantástico
Minha magia corria forte nas minhas veias
Por onde também corria o meu sangue imortal
Foi então que eu conheci o dissabor da maldição
Ao descer dos meus salões arcanos
Para me ter com os mortais
Os mortais me encheram de encanto
Com sua juventude e fragilidade
Mas logo eles se tornaram cansados e curvados pelo tempo
Em apensas um breve suspiro toda a vida deles
Se esvaiu para o reino da morte
Onde todos eles dormem seu sonho eterno
Uma enorme tristeza inundou meu coração
Enquanto os últimos dias do Verão passavam depressa
Novas batalhas foram vencidas, porém com muitas perdas
Muitos de meus antigos companheiros imortais tombaram em batalha
E alguns se corromperam nas trevas do inimigo
Tentados por sórdidas promessas de poder
Logo o Outono chegou, fazendo o verde das folhas se tornar dourado
Me fazendo relembrar os tempos da aurora do mundo
Mas o mundo havia mudado e eu também
Não era mais uma princesa, era uma rainha sábia
E eu encontrei nova beleza entre os mortais que eu inspirava
Entre as cores do amarelo outonal
Usei a minha magia para prezervar tudo que havia de belo
Que restara das primeiras eras do mundo
Criei um refúgio para os últimos de minha raça
E criei um sonho de nova vida aos mortais
Mas lá no fundo uma tristeza não saia do meu coração
Pois eu sabia que tudo estava mudando
Os dias de outono passavam rapidamente
As folhas farfalhavam e caiam com o vento
A encontrei perdida nos bosques labirínticos
Donzela mortal que eu acolhi e criei como uma filha
Ela aprendeu muito do que eu sabia
E ela encheu de alegria meu coração envelhecido
Porém, como toda mortal
Ela precisava ir para as mansões dos mortos
E as minhas lágrimas incontáveis se derramaram sobre a terra
Em forma de uma chuva sem fim que assolou os vales
Com ela veio mais guerra, peste e tristeza
Enquanto as ultimas folhas do Outono caiam
O próprio mundo dos mortais se enchia de sombras
Enquanto hostes cadavéricas destruíam tudo que era belo
Enquanto estava imersa em meus prantos
Não consegui preservar minha morada e todas as coisas antigas que eu guardava
Que se perderam para sempre e não podem mais ser recuperadas
Foi então que as ultimas folhas do outono caíram
E tudo se escureceu, enchendo o coração dos mortais de medo
Quase todos os imortais se foram e eu fiquei sozinha nos bosques escuros
Enquanto a noite caia e as sombras adensavam nos corações das florestas
Em antigos recantos eu vagava como uma antiga feiticeira da escuridão
Eu me tornara a senhora das lágrimas, um espectro de desespero
Foi quando o ocaso se deu, alongando as sombras profundas
Que os primeiros flocos de neve começaram a cair
Trazendo um frio cortante que tingiu os campos de branco
Todas as cores desapareceram do mundo, restando apenas as trevas
E a imensidão pálida que cobria o mundo gélido
Tudo tão frio, tão escuro
Então veio a Noite e suas criaturas mais mortas do que vivas
Tudo que me restava era o lamento e a melancolia
De tudo o que passou e não pode mais voltar
Minha alma esta enegrecida pelo tempo e pela dor
Meu espírito já esta morto em vida, enquanto meu corpo perambula pelas trevas
Entre os galhos retorcidos eu espreito como um espectro de desespero
No meio da floresta do mundo
Após incontáveis eras de lamentos dolorosos
Quando a esperança já se encontra totalmente morta
Meus olhos vertem um sangue negro, pois minhas pálpebras foram tomadas por chagas
Pelas feridas causadas pelo pranto interminável em que eu estou imersa a tempos incontáveis
Enquanto os desprezíveis mortais desta era, combalidos pela sombra, se corrompem
Dentro da escuridão, eu procuro os túmulos
Procurando em vão a entrada para as moradas dos mortos
Para encontrar todos aqueles que se foram
Para encontrar o tempo que não mais volta, me trazendo memórias melancólicas
No fim a maior maldição não era a mortandade dos mortais e sim a perenidade
Pois foi a Perenidade que me fez me tornar a Donzela das Lágrimas

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